"De repente, era só uma vontade louca de escrever. Eu avançava no livro, mas não processava a informação. Tudo dançava à minha frente, e eu sei que só pararia de dançar quando libertasse os passos e escrevesse.
Pausa para um gole.
Abri a bolsa e escolhi minha caneta nova, que lembrava as canetas importadas que minha tia-madrinha me dava, com uma ponta 0,4. Essa aqui custou R$ 1,90 em uma lojinha a meia quadra daqui.
Não me imaginaria escrevendo aqui há algumas horas - não sei que horas são, deixei o tempo ir sem mim. Escrevi muito e minha mão doía, como de praxe.
Outro gole.
O gole foi generoso e o garçom me assustou arrancando o cardápio da mesa. Não faz mal, não preciso dele. Continuemos. Marco a data na página: 03.11.10.
Fiz minha terceira prova de mestrado. Fui sem nenhuma esperança. Escrevi firme, mas sem pretensão. Não morro se não passar. Mas passar resolveria meus problemas de grana por 2 anos...
Mas não tenho segurança nenhuma dessa vez, como já tive antes. Na verdade, penso até que não passar será outra libertação. Continuo isso em outro momento.
Entrego a prova e saio da sala. Não procuro ninguém, já que pouco conheço. Mas os conhecidos me cumprimentam, desejam sorte e se oferecem para ajudar "no que for preciso". Sorrio, agradeço e entro no elevador com receio de ser agredida pela porta de novo. Ela fechou no meu braço na entrada para a prova. Olho agora e o lugar ainda está levemente vermelho, mas não dói.
Um gole e pausa para encher o copo.
Saí da prova e rumei para o bar em frente, toda decidida. Escolhi uma mesa e ocupei. Pedi uma cerveja e abri meu livro. Ainda não terminei 'Os Vagabundos Iluminados', do Kerouac. Até li umas 4 ou 5 páginas antes da prova começar. Mas agora, aqui, é diferente.
Sentei, só, eu e meu livro, e uma garrafa de cerveja, absurdamente gelada. Notei o olhar do garçom. Depois, das 2 mesas ao redor e de quem passava. Maldita capital do interior.
O garoto em frente sorria maliciosamente. Ergui o livro de forma a tirar o 'sorriso' de meu campo de visão. O rapaz com ele fumava sem parar e falou algo sobre o título do livro, que não ouvi e ignorei.
Duas mulheres ocuparam uma mesa à esquerda. Falavam sobre homens e, volta e meia, sobre solidão. Achei que se referiam a mim às vezes, mas não quis apurar a audição.
Gole.
Os vagabundo do Darma, a escalada à montanha e tudo o mais foram me absorvendo. O redor já não me incomodava (nem mesmo o barulho infernal dos ônibus) e passei a ignorar os olhares.
Pés na cadeira da frente, outra cerveja e senti-me estudante de novo. Parei o livro, cheia de planos e sensações de otimismo. Quase plenitude.
Pensei em ligar pro namorado e contar o que estava acontecendo. Mas ele podia estar na prova ainda... Pensei em ligar pra minha irmã vir me fazer companhia. Foi quando percebi que, aquela companhia, o livro, a cerveja, o caderno, a caneta e o vento bastavam.
Comecei então a escrever e, agora que já o fiz, hora de voltar ao livro."
* Entre um gole e outro de cerveja, aparentemente solitária numa mesa de boteco na beira da pista, me vieram essas páginas. Talvez seja o começo de algo. Talvez seja só a falta de alguém pra conversar. Talvez não seja absolutamente nada e eu fiquei feliz à toa. Aí me lembro que sempre gostei disso: escrever sem razão, por pura e simples vontade de escrever. Melhor aproveitar o momento então antes que fuja de novo.
ÀS vezes me esqueço da beleza da simplicidade.
ResponderExcluirÀs vezes vou remoçando só de olhar pra ela. Porque às vezes só uma caneta basta pra nos encontrarmos com nós mesmas e sorrir ou chorar e nos sentir vivendo, sonhando, superando, evoluindo. E foi contigo que eu aprendi que qualquer momento eh O momento. Que sempre há de ser alguma coisa de valor a emanar de nós por algum motivo desconhecido mas por termos nos assumido LUZ, sempre é por um bom motivo. Sempre.