sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O engodo da poesia

Quando não tenho muito o que fazer, ou até tenho, mas tô cansada demais, me pego lendo textos desconhecidos de pessoas mais desconhecidas ainda. Vez ou outra, até me surpreendo com algum trecho que me atinja, ou alguma boa construção, uma bela sacada que quase salva um texto medíocre...
Mas há uma coisa da qual é impossível fugir: os pretensos poetas.
Por que há uma mania (talvez um consenso, até) de achar que recortar frases em quatro partes é fazer poesia. Todo mundo quer brincar de ser poeta, mesmo que não faça a mínima idéia do que está escrevendo. Deve massagear o ego desses alguéns por aí se sentir mais culto ou inteligente por se autodenominar "poeta". Mas, falando sério agora, será que esses versinhos simulados realmente podem ser chamados de poesia? Tenho cá mil dúvidas... Não, tenho uma certeza: poesia é muito mais que isso!
Tem aquele poeta que acha muito bonitinho fazer tudo rimadinho e arrumadinho, e chega a construir "belas" composições como rimar "amor" e "dor", "paixão" e "coração", "tristeza" e "beleza" e por aí vai. Ah, importante ressaltar: esse tipo de "poeta" impreterivelmente escreve sobre "amor", seja lá o que ele entende por isso. Normalmente é uma dor de cotovelo, daquelas de breganejo ou pagode de quinta, e se estiver feliz vai falar das qualidades que só ele vê em sua adorável piriguete ou ela em seu querido cafajeste.
O segundo tipo é o que se julga o maldito, aquele que enxerga coisas na sociedade que mais ninguém enxerga (ele pensa). Então ele vai "mostrar ao mundo suas próprias mazelas", ou "a verdade nua e crua". Esse é o tipo que se julga o portador da verdade absoluta, normalmente ateu de boteco, pretenso socialista ou algo do tipo, ou então ele paira acima de toda a humanidade. Tipinho desprezível, é o típico pseudocult.
Existem vários outros tipos, mas a maioria é apenas vertente dos dois tipos clássicos: os apaixonados (sofredores ou felizes) e os "heróis da resistência" (malditos ou inteligentes demais para a sociedade). E é uma pena que sejam essas enfadonhas e nauseantes mostras de poesias que circulem e cresçam aos montes pelas livrarias e redes virtuais. Porque eu sei sim que há uma boa poesia pedindo pra ser vista... 
Mas enquanto ela não consegue se mostrar aos meus olhos, sigo detestando os falsos poetas que recortam frases de cartões de dia dos namorados e colam em pequenas estrofes bobas e acham que poesia não é nada mais que escrever em versos.
Prefiro bem mais a prosa despretensiosa, que não se julga superior a nada nem a ninguém e, nela mesmo, acaba contendo a poesia que esses ridículos poetas de mesa de bar não encontram em seu pseudointelectualismo de merda.
E esse é um post de saco cheio mesmo de tanta baboseira que leio por aqui. E se acha o que escrevo uma porcaria também, tenha toda a razão, porque eu só tenho uma coisa um pouquinho melhor que esses que estou aqui criticando: eu não me rotulo como "escritora" nem nada parecido ;)

sábado, 6 de novembro de 2010

Pensamentos solitários num fim de tarde, numa mesa de bar*

"De repente, era só uma vontade louca de escrever. Eu avançava no livro, mas não processava a informação. Tudo dançava à minha frente, e eu sei que só pararia de dançar quando libertasse os passos e escrevesse.
Pausa para um gole.
Abri a bolsa e escolhi minha caneta nova, que lembrava as canetas importadas que minha tia-madrinha me dava, com uma ponta 0,4. Essa aqui custou R$ 1,90 em uma lojinha a meia quadra daqui.
Não me imaginaria escrevendo aqui há algumas horas - não sei que horas são, deixei o tempo ir sem mim. Escrevi muito e minha mão doía, como de praxe.
Outro gole.
O gole foi generoso e o garçom me assustou arrancando o cardápio da mesa. Não faz mal, não preciso dele. Continuemos. Marco a data na página: 03.11.10.
Fiz minha terceira prova de mestrado. Fui sem nenhuma esperança. Escrevi firme, mas sem pretensão. Não morro se não passar. Mas passar resolveria meus problemas de grana por 2 anos...
Mas não tenho segurança nenhuma dessa vez, como já tive antes. Na verdade, penso até que não passar será outra libertação. Continuo isso em outro momento.
Entrego a prova e saio da sala. Não procuro ninguém, já que pouco conheço. Mas os conhecidos me cumprimentam, desejam sorte e se oferecem para ajudar "no que for preciso". Sorrio, agradeço e entro no elevador com receio de ser agredida pela porta de novo. Ela fechou no meu braço na entrada para a prova. Olho agora e o lugar ainda está levemente vermelho, mas não dói.
Um gole e pausa para encher o copo.
Saí da prova e rumei para o bar em frente, toda decidida. Escolhi uma mesa e ocupei. Pedi uma cerveja e abri meu livro. Ainda não terminei 'Os Vagabundos Iluminados', do Kerouac. Até li umas 4 ou 5 páginas antes da prova começar. Mas agora, aqui, é diferente.
Sentei, só, eu e meu livro, e uma garrafa de cerveja, absurdamente gelada. Notei o olhar do garçom. Depois, das 2 mesas ao redor e de quem passava. Maldita capital do interior.
O garoto em frente sorria maliciosamente. Ergui o livro de forma a tirar o 'sorriso' de meu campo de visão. O rapaz com ele fumava sem parar e falou algo sobre o título do livro, que não ouvi e ignorei.
Duas mulheres ocuparam uma mesa à esquerda. Falavam sobre homens e, volta e meia, sobre solidão. Achei que se referiam a mim às vezes, mas não quis apurar a audição.
Gole.
Os vagabundo do Darma, a escalada à montanha e tudo o mais foram me absorvendo. O redor já não me incomodava (nem mesmo o barulho infernal dos ônibus) e passei a ignorar os olhares.
Pés na cadeira da frente, outra cerveja e senti-me estudante de novo. Parei o livro, cheia de planos e sensações de otimismo. Quase plenitude.
Pensei em ligar pro namorado e contar o que estava acontecendo. Mas ele podia estar na prova ainda... Pensei em ligar pra minha irmã vir me fazer companhia. Foi quando percebi que, aquela companhia, o livro, a cerveja, o caderno, a caneta e o vento bastavam.
Comecei então a escrever e, agora que já o fiz, hora de voltar ao livro."

* Entre um gole e outro de cerveja, aparentemente solitária numa mesa de boteco na beira da pista, me vieram essas páginas. Talvez seja o começo de algo. Talvez seja só a falta de alguém pra conversar. Talvez não seja absolutamente nada e eu fiquei feliz à toa. Aí me lembro que sempre gostei disso: escrever sem razão, por pura e simples vontade de escrever. Melhor aproveitar o momento então antes que fuja de novo.